Entre 1903 e 1908 Rainer Maria Rilke, poeta nascido em Praga, na República Tcheca, escreve uma série de dez cartas dirigidas ao jovem Frans Xaver Kappus. Nelas estão contidas desde apreciações e conselhos acerca do estilo literário de um poeta até descrições momentâneas de mistérios e contemplação. Todavia, não é fácil “abraçar” – explicar – a poesia de Rilke. Por quê? Porque as “razões” do amor, da ternura, da coragem, da necessidade de escrever, da beleza, dos mistérios da solidão e do “entesourar” contínuo – eterno – dos amantes que se encontram não são tão claros como gostaríamos que fossem, “[...] em última análise, é precisamente nas coisas mais profundas e importântes que estamos indizivelmente sós [...]”, salienta Rilke na primeira carta endereçada ao Sr. Kappus no dia 5 de abril de 1903. Tais “coisas profundas” devem ser amadas, saboreadas e experimentadas, e elas estão contidas em “mundos” que se abrem e se fecham – livros – no horizonte de nossos olhos: “Um mundo se abrirá aos seus olhos: a felicidade, a riqueza, a inconcebível grandeza de um mundo. Viva nesses livros um momento, aprenda neles o que lhe parecer digno de ser aprendido, mas, antes de tudo, ame-os”. Os livros podem ser amados, saboreados e, desta maneira, os “mundos” se abrem.
Rilke é um daqueles autores que perfumam a vida e enche o coração de amor. Quem lê sente saudade e, por este motivo, sempre volta: é como um perfume, um cheiro bom, que o sabemos ser maravilhoso, mas o saber impulsiona, necessariamente, a senti-lo mais uma vez. A cada leitura uma nova claridade, um parto, um espanto, mas não um simples espanto que vem e logo vai, mas trata-se do espanto dos apaixonados: não cessa. Os embriagados de amor perceberão uma reciprocidade enorme ao ler as Cartas a um Jovem Poeta. Penso naquele amor verdadeiro que toma o coração e arrasta a alma, amor este que aproxima os corpos, faz os amantes trocarem olhares, sobressaltarem de alegria, risos, e correrem pelos campos ou andarem devagarzinho de braços entrelaçados no silêncio da noite. Estes são os amantes que se encontram na mais profunda solidão. “É bom estar só, porque a solidão é difícil”. Ora, talvez, o amor verdadeiro não seria o encontro de duas solidões? Rilke é claro quando fala da dificuldade das coisas difíceis: “Amar também é bom: porque o amor é difícil. O amor de duas criaturas humanas talvez seja a tarefa mais difícil que nos foi imposta, a maior e última prova, a obra para a qual todas as outras são apenas uma preparação”. Desta maneira, o amor seria uma forma de amadurecer, tornar-se um mundo para si, entretanto, salienta Rilke: “Os homens, com o auxílio das convenções, resolveram tudo facilmente e pelo lado mais fácil da facilidade [...]”. As convenções sociais, os chavões socialmente estabelecidos, os comportamentos pré-estabelecidos e as barganhas no amor ganharam as manchetes: “Nenhum terreno da experiência humana é tão cheio de convenções como este”. Tornar um mundo para si, dirá Rilke, no encontro com um outro ser é sublime e divino.
O momento de nossa vida que lemos as Cartas a um Jovem Poeta fica marcado, impresso no coração palpitante do leitor apaixonado. Viva Rainer Maria Rilke!…o poeta encantado do maravilhoso amor.
RILKE, Rainer Maria. Cartas a um Jovem Poeta. Trad. Paulo Rónai. 10. ed. Porto Alegre: Editora Globo, 1980.
Andrei Venturini Martins
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