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Posso ser séria, brincalhona, distraída, chata, abusada, legal,ótima, travosa (como diz um grande amigo) isso depende de você, de mim, do dia ou da situação. Quer mesmo saber quem sou eu? Precisa de mais proximidade. Gosto de ler e escrever, embora nem sempre tenha tempo suficiente para tais práticas. Gosto de tanta coisa e de tantas pessoas que não caberiam aqui se a elas fosse me referir uma por uma. Acho a vida um belo espetáculo sem ensaios onde passeamos dia a dia a procura da felicidade. Para falar mais de mim profissionalmente: Sou professora. Graduada em Letras-FAFICA. Atualmente estudo sobre Leitura Literária no Ensino Fundamental. Atuo no Ensino Fundamental e no Ensino Médio.

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sexta-feira, 16 de março de 2012

Prestes a interpretar o carnavalesco Joãosinho Trinta, Matheus Nachtergaele confessa ser leitor da Bíblia

“Não sou um grande ator”

Prestes a interpretar o carnavalesco Joãosinho Trinta, Matheus Nachtergaele confessa ser leitor da Bíblia

Marília Kodic
fotos Paula Prado

Um rouco e soluçante Matheus Nachtergaele, 43, encontrou a reportagem da CULT, em São Paulo, para falar dos papéis de Joãosinho Trinta e Zé do Caixão, que viverá nas telas neste ano. Mas avisou: “Cada vez mais acho que não tenho tanto a dizer. Isso deveria estar dito nos personagens. Dizer simplesmente me parece cada vez mais inútil e constrangedor”.

Nas três horas de conversa que comprovaram o contrário, Matheus, cativo do público por seus personagens socialmente marginalizados (contabiliza 25 papéis apenas no cinema, sem contar o teatro e a televisão), falou de seu interesse por Dostoiévski, Guimarães Rosa, Aluísio Azevedo, Ingmar Bergman, Elia Kazan e a Bíblia.

Além disso, falou do começo da carreira, quando foi rejeitado por Antunes Filho – “Ele tinha dito que eu não era ator, e eu tinha acreditado nisso” –, e elogiou o bom momento que vive o cinema nacional. Mas com um apelo: “Espero que não se abandonem as tentativas de risco”.

E, de forma surpreendente para a reportagem, diz não se considerar bom ator.

CULT – Você está prestes a encarnar Joãosinho Trinta e Zé do Caixão nos cinemas – duas figuras ligadas historicamente à ruptura da vida cotidiana, uma por meio do Carnaval, outra pela morte. Como relaciona os dois personagens?

Matheus Nachtergaele –
Percebo que os dois alegorizam alguma coisa. São figuras da arte como popularidade, duas figuras que estiveram na contramão do que se imagina que é direito, entre aspas, e que conseguiram, sem recursos, fazer arte no Brasil fora do esquema armado e esperado.

São inusitados, corajosos, obsessivos, batalhadores, guerreiros. E o dinheiro não é exatamente o que os move – ou seja, estão livres.

Tenho a maior honra de haverem pensado em mim para esses projetos. É muito interessante homenagear alguém que se admira.

Em que fase de produção se encontram os dois projetos?

O Zé do Caixão ainda está em captação. O Joãosinho Trinta é um projeto antigo, de quatro anos, sobre o qual a gente fala há muito tempo. Começo a filmar neste mês. Com a morte do João [em dezembro passado], esse projeto, de alguma forma, mudou sua face para mim. Pessoalmente, deixou de ser uma homenagem em vida para ser uma homenagem a um grande homem que se foi.

Será uma cinebiografia?

O filme vai abordar o primeiro Carnaval que ele fez como carnavalesco. Ele começou fazendo adereços para o [Teatro] Municipal [do Rio de Janeiro] e, de lá, foi levado para o Salgueiro. Em certo momento, assinou o Carnaval e ganhou. Será filmado no Maranhão, Rio de Janeiro e em Paulínia, onde serão os estúdios.

Como foi a experiência de dirigir
seu primeiro longa-metragem, A Festa da Menina Morta, em 2008?

Demorei dez anos para escrever o filme. Tive a honra de ser ator num momento em que o cinema brasileiro se refazia. Fiz muitos filmes em pouco tempo e, aos poucos, isso foi me dando o desejo de fazer um também. Fazer filme é um parto muito grande. Cada detalhe, o que é dito, o quadro do fotógrafo, o figurino, a escolha dos atores, a ambiência… O filme é uma espécie de recorte do que eu sou e do que penso sobre a vida.

Ele estreou na mostra paralela do
Festival de Cannes e participou de muitos outros ao redor do mundo. Como foi a recepção no Brasil?

Uma reclamação: acho que o Brasil olha pouco para esse tipo de trajetória. Houve certo silêncio. Não sei muito bem por quê. Não é um filme fácil. É sobre a superação do luto, sobre uma Amazônia perdida, que nós esquecemos. Então é um filme difícil, de certa forma. É engraçado, o Claudio Assis me falou uma vez que os grandes filmes no Brasil não são vistos. Acho que tem a ver com divulgação e grana.

Pensa em repetir a experiência de diretor?

Estou escrevendo um filme agora, mas vai demorar anos. Me perguntam às vezes: “Quando? Quando?”. Eu digo: “Não sei, não posso saber”. É absolutamente difícil e complicado, se você quiser ser honesto. Não é bem um trabalho. É como se fosse um chamamento. Você é inserido num contexto, é sugado, depois vomitado. É como se fosse uma vocação acontecendo.

Você tem em mente um projeto sobre a reserva indígena de Dourados (MS), que tem o maior índice de suicídio per capita do mundo. A morte é um tema que o fascina?

Eu tenho interesse nesse assunto. O que acontece em Dourados é uma questão que o Brasil não sabe, não vê, não pensa.

O que faz esses índios cometerem suicídio?

O maior índice acontece entre 11 e 16 anos. Acho que se desesperam pelo fato de se saberem não inseridos. Na juventude, talvez isso tenha uma carga grande de desolação, desilusão, e, no ímpeto, se matam. Se você é índio, não tem direitos como cidadão brasileiro.

Você mora numa reserva mínima, numa terra que já foi sua reduzida a alguns hectares, ao lado de uma cidade grande, onde tem carro, moto, Xuxa, McDonald’s, tênis… E você não é parte disso.

Em uma entrevista em 2009, disse não ter celular, nem usar a internet… Ainda é assim? Você tem aversão a tecnologia?

Não. Eu tenho aversão a aceleração. Acho que a gente está andando devagar e as tecnologias, muito rápido. Uma das coisas que mais me irritam é o celular. Tenho um agora. Tive por muitos anos, depois fiquei seis anos sem. Foi ótimo. Era uma opção de vida. Eu não queria ser acessado a todo momento.

Hoje em dia as pessoas te mandam um e-mail e dali a meia hora perguntam: “Você recebeu?”. Não. Eu não sou desse tipo. Não tenho nada contra, entendo que a vida esteja assim.

Você cresceu com seu pai. Como foi sua infância?

Minha mãe morreu muito cedo, eu tinha 3 meses. A infância é algo muito angustiante – parece uma preparação do que será. Mas tive uma infância bem privilegiada. Eu cresci no mato, com cavalo, boi, sítio, avós, panqueca, pinha, ajudar a avó a fazer pão, tirar leite de vaca.

Sua família o apoiou em sua decisão de tornar-se ator?

Quando você anuncia para a família, ela entra sempre em surto. É um pacotão de horrores. Imaginam desgraças terríveis: falta de grana, drogas, loucura, instabilidade. Mas nunca deixaram de assistir a nada do que fiz, nenhum deles.

Antes de se tornar ator, nos anos 1980, você foi para a Bélgica ficar com seus avós. Por que decidiu sair do país?

Eu fazia artes plásticas na Faap [Fundação Armado Álvares Penteado], e uma amiga minha me convidou para ser par dela num teste para o Antunes Filho, no CPT [Centro de Pesquisa Teatral]. Eu não queria ser ator, não pensava nisso. Eu queria fazer desenho animado, estava bem envolvido nisso.

Só que eu passei [no teste do CPT]. Abandonei a Faap e fiquei envolvidíssimo. O Antunes estava montando uma peça com Os Sete Gatinhos e A Falecida. Então comecei no teatro com Nelson Rodrigues, de cara com Antunes.

Mas não fiz. Ele me tirou. Disse que eu não era ator, que tinha que repensar minha vida e provavelmente eu não seria um ator. Fui para a Europa, bem deprimido. Botei meu coração naquilo.

O que foi fazer em Bruxelas?

Pensei em estudar teatro. Mas conheci um belga que tocava músicas brasileiras e gostava de Ivan Lins. Eu entendo muito de Ivan Lins, então a gente começou a cantar música brasileira na noite. E aí eu vi que estava de novo no palco.

Mas foi um momento terrível esse na Europa. Porque o Antunes tinha dito que eu não era ator, e eu tinha acreditado nisso. Mesmo. Mas acho que ele fez a coisa mais certa. Me botou na berlinda. Acho que fez de propósito. Hoje em dia, penso assim. Deu um não, pra ver se eu tinha um sim. Eu tinha.

Você tende a interpretar personagens socialmente marginalizados. É uma escolha sua?

Não, é uma coisa que acontece comigo. Fico pensando… O Cintura Fina, o primeiro travesti que foi para a rua em Belo Horizonte. O João Grilo, o amarelinho safado que sobrevive aos poderes. O Carreirinha, o peão alcoólatra que tem que se salvar. Acho que todo bom personagem está de algum modo sob pressão, psicológica ou social. Está aflito, tentando viver. Todo bom personagem está à beira de algum abismo, em algum conflito muito grave.

E, por algum motivo, fiquei incumbido de representar esses personagens. Os que sofrem a pressão do capitalismo, do que se entende como mainstream. A maior parte do povo brasileiro vive sob essa pressão.


Você se identifica com esse tipo?

Todos os personagens são você mesmo. É um pouco reducionista, mas, se não for você, não dá pra fazer. Eles vão se sobrepondo e fazendo o húmus, criando camadas em cima de você, e, embaixo, vai se formando uma terra fértil.

Como vê a atual produção cinematográfica
do país?

Acho que está lindo. Estamos bem. No que se chamou de retomada, tínhamos muitos experimentos, diversas faces. Agora percebo que a gente vive uma fase de afirmação do nosso cinema.

Com isso se abandona um pouco o que se poderia desejar como melhor cinema brasileiro, mas, ao mesmo tempo, se conquista um público, se ganha uma indústria, o cinema passa a ser um lugar possível, algo que nunca foi para o Brasil e que está sendo hoje em dia.

Os filmes são de grande qualidade, realmente conseguem angariar o público. Agora as pessoas gostam de ver filme brasileiro. E isso é importantíssimo, porque o cinema é um dos melhores lugares para um povo se ver. A boa dramaturgia serve pra você pensar sobre você. Ou rindo ou chorando.

Só espero que não se abandonem as tentativas de risco.

O que quer dizer com tentativas
de risco?

É como estou te dizendo, o nosso cinema está se afirmando. Mas o nosso cinema de arte não pode ser esquecido, quero dizer, o cinema realmente pessoal.

Acho que o filme de arte é um olhar realmente pessoal sobre a vida, uma maneira de dizer “Assim vejo a vida”. A gente sempre fez isso no Brasil.

O que acha das telenovelas? O modelo
está desgastado?

Não. Ele permanece vivo e vívido e, no Brasil especificamente, é parte do cotidiano das pessoas. Talvez para algumas pessoas – ou, pior, para muitas – seja a única maneira de absorver cultura. Fico irritado quando a novela não consegue dar às pessoas aquilo que merecem – na verdade, ela é uma responsabilidade.

Alguns críticos defendem que, hoje em dia, é nas séries de TV que se encontra a verdadeira inovação da linguagem
audiovisual, não mais no cinema. O que acha disso?

Não assisto a séries, então é uma pergunta que eu não tenho como te responder.

Não! Peraí… Vou pensar sobre isso. Assisti àquela saga Crepúsculo, do vampiro. Mas não acho que substitui o cinema.

Acho que obviamente o cinema sofre com esse caos. Ir a uma sala de cinema hoje em dia se tornou dificultoso. O próprio encanto, de alguma forma, foi perdido. Mas, quando você realmente escolhe um filme, entra numa sala de cinema e assiste [a ele], acontece alguma coisa sem nome, que é esse milagre chamado cinema.

O que acha das pessoas que baixam
filmes piratas pela internet?

Isso acontece e não me incomoda. Mas a verdade é que nada substitui estar numa sala de cinema, com aquela tela grande, com pessoas do seu lado, todos viajando na mesma onda. A grande viagem é essa.

Que personagens admira?

Sou muito fã da [atriz] Vivien Leigh, acho Um Bonde Chamado Desejo maravilhoso. É uma peça do Tennessee Williams que deve ter sido encenada não sei quantos milhões de vezes, mas ela fica registrada e marcada no peito quando o Elia Kazan a filma.

Sou fã de algumas pessoas. Marguerite Duras, uma escritora francesa. Grande Othelo. Gosto muito de ler Dostoiévski, gosto de Guimarães Rosa, de verdade, leio e releio. Gosto muito de Aluísio Azevedo, O Cortiço é um dos meus livros favoritos. Aliás, daria um filmaço…

Você também é fã assumido de Bergman. O que o atrai nele?

Gosto mesmo. Ele é um conhecedor profundo da dramaturgia mundial, um cara muito culto. E, nos filmes, consegue utilizar isso para falar do mundo que vê, sempre com um corte profundamente subjetivo e honesto. Faz isso de maneira gloriosa. E consegue falar de amor sem ser piegas.

Está lendo algo no momento?

Não posso mentir, né? Já li bastante, hoje em dia leio menos. Na verdade, você pode achar estranho… Estou lendo o Gênesis, essa é a verdade. Eu leio a Bíblia como um livro.

Você é católico?

Não. Acreditar em Deus é matar Deus. Você não tem que acreditar no que existe. O que é é. Ponto. Durante muitos anos eu me chamei de ateu, agora tomo cuidado com isso. Acredito no milagre, mas sem um Deus específico. É como se ele percorresse tudo, o tempo todo. Na maravilha e no terror.

O que faz em seu tempo livre, se é que o tem?

Tenho muito tempo livre. As pessoas ficam imaginando que a gente trabalha sem parar… A gente não trabalha sem parar! Eu não. Consegui esse espaço, de passar algum tempo ruminando, como uma vaca. Passo muito tempo ocioso.

Atualmente tenho gostado de me retirar. De ficar em lugares com poucas pessoas, onde a natureza ainda possa se expor de alguma forma. Eu sou caminho de formiga, gosto de ir aos mesmos lugares. Minha casa, minha roça, em Minas. E escrever. Roteiro, memória, poesia. Canções.

Teremos acesso a esse material algum dia?

Sou vergonhoso! Aliás, não gosto de dar entrevistas.

Não costumar dar muitas…

Cada vez menos. Cada vez mais acho que não tenho tanto a dizer. O que tenho a dizer deveria estar dito nos personagens, no corpo, na carne deles. Nas interjeições, nos projetos escolhidos. Tudo isso é um discurso. Dizer simplesmente me parece cada vez mais inútil e constrangedor.

Eu mesmo sou só isso, qualquer um procurando entender a vida e espantado com o que ela é.

Tem algum projeto?

Tenho. Talvez não interesse a ninguém, mas aconteceu comigo uma coisa interessante: eu, muito rápido, fui elevado à categoria de grande ator. Não sou um grande ator. Durante muito tempo, fiquei focado no meu trabalho. Esqueci das pessoas. Quero aprender a amar.

FONTE

http://revistacult.uol.com.br/home/2012/03/nao-sou-um-grande-ator/

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